Mt 14, 22-33
“Coragem! Sou eu!  Não tenham Medo!”
    É comum ler nos jornais e revistas os resultados de pesquisas que apontam o medo e a insegurança entre as principais preocupações do nosso povo – o medo da violência, do desemprego, da pobreza, da solidão, da velhice e muitos outros.  O medo parece até tomar conta de uma boa parta das nossas instituições – o medo de tomar as medidas necessárias para uma justa reforma agrária, por parte das autoridades competentes; o medo por parte de muitos líderes religiosos diante dos desafios do mundo de pós-modernidade, levando até a paralisia e o fechamento; o medo de procurar novas soluções para novos desafios. 

O medo parece ser a força motora da atividade – ou da falta da mesma – de muitas pessoas, grupos e instituições.
    A comunidade eclesial onde nasceu o Evangelho de Mateus também sentia medo.  Os seus membros (na sua maioria judeu-cristãos, bem diferente etnicamente das comunidades lucanas) enfrentavam oposição e perseguição por parte das autoridades das sinagogas.  A comunidade estava em luta com o chamado “judaísmo formativo”, para definir o rumo que o judaísmo iria tomar depois do desastre de 70 d.C. quando foram destruídos Jerusalém e o Templo. Com a eliminação, pela repressão romana ou por guerra civil, dos Saduceus, dos Zelotas e dos Essênios, somente dois grupos organizados sobreviveram para disputar a liderança dentro do judaísmo – o da linha farisaica e o grupo judeu-cristão, representado pela comunidade de Mateus.  Era uma luta de muito radicalismo, como costuma acontecer nas brigas fratricidas.  O sofrimento da comunidade de Mateus é retratado em Mt 10, 22: “Sereis odiados por todos por causa do meu nome.  Mas quem perseverar até o fim será salvo”.
    É neste contexto que se entende o texto de hoje.  Os discípulos, ao verem Jesus, acham que é um fantasma e ficam apavorados.  A comunidade de Mateus era semelhante – diante da perseguição e do sofrimento, Jesus parecia para eles um fantasma – uma ilusão, uma fugacidade, incapaz de dar sustento à sua vida comunitária de fé.  Diante do medo dos discípulos, Jesus é taxativo: “Coragem!  Não tenham medo! Sou eu!”. Mateus relata essa história – acrescentando esses elementos em comparação com o texto mais sóbrio de João 6, 16-21 – para ajudar a sua comunidade a entender que Jesus não é fantasma, mas uma presença real, vivificante, fortalecedora e libertadora no meio da comunidade, especialmente na hora das dificuldades  e perseguições.
    Tipicamente, o Evangelho de Mateus destaca à figura de Pedro (como também em 16,13-20; 17,24-27).  Pedro era personagem muito importante em Antioquia, talvez o local da última redação de Mateus.  Aqui Pedro é o protótipo do discípulo – cheio de amor, mas com uma fé enfraquecida pela dúvida.  O estender da mão de Jesus é um convite a Pedro, à comunidade de Mateus, e a nós hoje para dar uns passos para o desconhecido, para não nos fechar nas nossas seguranças, freqüentemente falsas, que nós mesmos construímos, mas de termos a coragem de enfrentar os ventos da vida, mesmo quando contrários, pois Jesus está realmente conosco e como disse Paulo “Se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).
    Ter fé e não ter medo por causa de Jesus não quer dizer: “Não tenham medo, confiem em Deus, e Ele garantirá que as coisas que os amedrontam não lhes acontecerão”, mas antes: “Não tenham medo, confiem em Deus. É bem possível que as coisas que os amedrontam vão lhes acontecer, mas não devem ter medo disso, porque Deus estará ao seu lado”!  
A fé em Deus não tira os nossos sofrimentos e dificuldades, como querem tantos hoje, mas nos dá as forças necessárias para vencê-los. Deus não é um analgésico para as dores e dificuldades da vida, mas uma presença amorosa que anima, fortaleça e estimula, pois, como disse Paulo “a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (I Cor 1, 25)
Pe. Tomaz Hughes SVD
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