Em plena sinagoga há um homem possuído por um espírito mau em um dia de sábado. Trazendo o fato para nossos dias poderíamos pensar em uma celebração da palavra na comunidade. Enquanto Jesus ensinava, o espírito mau manifestava-se de maneira hostil no homem possesso.Não gostamos muito de ter que admitir a presença de um espírito mau em algum membro da nossa comunidade e imaginamos que o mesmo pode muito bem “baixar” naquele vizinho mal visto, naquele boteco mal freqüentado, nas baladas e nos Drive-in, em certos bailes, nos prostíbulos camuflados, nas más companhias, talvez nas seitas ou doutrinas contrárias ao cristianismo.Não queremos um espírito mau em nossa casa... mas o evangelista Marcos não engana seus leitores e afirma com todas as letras, que no meio da comunidade, durante uma celebração, tem um homem dominado por um espírito mau, que se sente incomodado com a presença de Jesus.O espírito mau não é aquele bicho feio, cheirando enxofre, com voz cavernosa e uma risada sinistra para assustar as pobres almas. Também ele não aparece por aí a torto e a direito, fazendo levitar camas enquanto que suas vítimas vomitam aquela gosma verde nojenta. Isso tudo é obra cinematográfica!O espírito mau age de maneira sorrateira e dissimulada, o danado tem a voz macia, é muito atraente e o seu poder de persuadir as pessoas, é grande. Uma hora ele vem disfarçado de uma ideologia, outra vez como um conceito que o sistema incute em nossa cabeça, outra hora ele vem na forma de uma doença chamada “normose”, onde a pessoa perde totalmente a consciência dos valores do evangelho e acha tudo normal, tudo permitido, mesmo a maior das atrocidades.É o relativismo que justifica todas as ações, sem considerar os ditames da consciência e os valores ético-morais. Em resumo, o espírito mau é tudo aquilo que escraviza o homem e abafa sua consciência não o deixando ser livre para decidir sua vida.Quem tem medo das ideologias do mundo globalizado, do consumismo e do neoliberalismo? A nossa cabeça se enche de fantasias e chegamos a pensar que não seremos felizes se não aderirmos aos apelos do mundo moderno.Quem é que precisa de Deus e do seu reino para ser feliz, se uma gorda conta bancária, nos dá tudo o que queremos, aqui e agora? O espírito mau interfere de tal modo em nossa vida que faz o sistema pensar e decidir por nós, o que é melhor. O Espírito mau até aceita que Deus existe e que Jesus é Santo, mas nos convence de que não precisamos mudar de vida por causa dele.É precisamente nesse contexto que surge diante do espírito do mau esse estraga-prazeres que é o Profeta, suscitado por Deus no meio do seu povo, ontem e hoje, para anunciar a verdade de Deus e desmascarar o espírito do mau.Os profetas jamais são bem vistos em uma sociedade onde os homens perderam a liberdade e a consciência e se movem a partir de certas correntes pensantes a serviço do sistema, que engana, mente de maneira deslavada corrompe e seduz, e por fim mata e violenta o ser humano.Alguém que diga o contrário do que pensa a maioria, logo será enxotado, perseguido e morto, pelos que manipulam a grande massa.Jesus é autêntico e fiel, seu ensinamento e seu jeito de viver revelam o Deus libertador e torna-se uma pedra no sapato do poder religioso do seu tempo, defendido pelas lideranças religiosas e sustentado pelo poder econômico.O compromisso de Jesus é com a verdade que o Pai revelou, e é daí que vem a sua autoridade.Por isso as pessoas ficam maravilhadas com o seu ensinamento e se admiram diante de suas obras prodigiosas, ele manda nos espíritos imundos, e, se um dia no paraíso, uma voz do mal seduziu a Eva, agora encontrou alguém superior que o fez calar a boca e sair daquele homem.Nossa Igreja é profética e tem o poder de mandar calar a boca ao espírito mau.Precisamos resgatar com urgência esse múnus profético que recebemos em nosso Batismo, pois no mundo e até em nossas comunidades há centenas e milhares de irmãos e irmãs, que precisam ser libertos.E se muitas vezes assistimos de braços cruzados a “derrocada” das forças do bem, é porque falta-nos talvez o testemunho de um ensinamento novo, feito com autoridade.