Mt 21, 1-12; Mt 26,14 – 27,66
Bendito aquele que vem em nome do Senhor!
Neste primeiro dia da Semana Santa, na tradição católica no Brasil com certeza não há comunidade que não celebra, com muito entusiasmo, a comemoração da entrada de Jesus em Jerusalém.  Organizam-se procissões e encenações, e quase todos fazem questão de levar alguns ramos bentos para a casa. Porém é muito importante resgatar o verdadeiro sentido da entrada de Jesus em Jerusalém, para que possamos celebrar a festa com mais profundidade.  O próprio Evangelho de Mateus nos dá uma dica, quando em v. 5 cita o profeta Zacarias. 

Pois Jesus, escolhendo entrar na capital desta maneira, estava fazendo uma releitura de Zacarias 9, 9-10.  O profeta (conhecido como Segundo Zacarias, pois capítulos 9-14 do livro são pós-exílicos) vivia em uma situação de grande opressão e pobreza, quando Palestina e o seu povo eram dominados pelo Impérialismo Grego, ou helenista, depois de Alexandre Magno.  O profeta procura animar o seu povo oprimido e manter viva a chama de resistência através da esperança na chegada de um Messias, que teria três grandes características: seria rei (9, 9-10), bom pastor (11,4-17) e “transpassado”(12, 9-14).  Portanto, quando Jesus e os seus discípulos fizeram a sua entrada em Jerusalém, era uma maneira forte de proclamar a chegada do Messias, do Rei esperado pelos pobres de Javé.
    Mas o rei proclamado por Zacarias e concretizado em Jesus era bem diferente dos reis dos países de então.  Enquanto estes faziam questão de apresentar-se publicamente com toda a pompa, montados sobre cavalos imponentes, o rei previsto por Zacarias iria entrar em Jerusalém montando um jumento – o animal do pequeno agricultor.  Pois o seu reino seria, não de dominação, opulência e opressão, mas de paz, de justiça e de solidariedade: “Dance de alegria, cidade de Sião; grite de alegria, cidade de Jerusalém, pois agora o seu rei está chegando, justo e vitorioso.  Ele é pobre, vem montado num jumento, num jumentinho, filho duma jumenta. Ele destruirá os carros de guerra de Efraim e os cavalos de Jerusalém; quebrará o arco de guerra.  Anunciará a paz a todas as nações, e o seu domínio irá de mar a mar” (Zc 9,9).
    Devia ter acontecido mais cedo neste dia uma entrada triunfal e pomosa em Jerusalém pela Porta Ocidental – achegada de Pilatos acompanhado por um coorte d elegionários romanos, com bandas, armas brilhantes, lanças e espada e provavlemente com o Governador montado num cavalo de raça, para demonstrar o seu poderio – o poder do Império. A entrada em Jerusalém de Jesus, à tarde e pela porta Orienta, era verdadeiramente uma entrada triunfal – mas do triunfo de Deus, do Messias dos pobres e justos, e uma viravolta nos valores da sociedade.  Era a rejeição dos valores opressores dos Reinos mundanos, a celebração de Javé, o libertador, que “ouve o clamor dos pobres e sofridos” (cf Ex 3,7).  Celebrar a memória deste evento no Domingo de Ramos deve nos levar a um cumpromisso maior com a construção de um mundo de paz verdadeira, fruto de justiça, partilha e solidariedade.  Assim nos empolgaremos na defesa da vida de todos os irmãos e irmãs e a do nosso planeta.  Quando falamos da entrada triunfal, lembremo-nos que é o triunfo da fraqueza de Deus, da Cruz, do projeto do Reino, pois como disse Paulo, “a loucura de Deus é mais sábia do que os homens e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (I Cor 1,25).  Cuidemos de não transformar a celebração litúrgica em um folclore, glorificando o poder e a dominação, fazendo o que fizeram em Jerusalém, conforme o hino “Queriam um grande Rei que fosse forte, dominador e por isso não creram nele e mataram o Salvador”.  A celebração de Domingo de Ramos é realmente uma da vitória, mas da vitória que vem de fidelidade ao projeto de Deus, no seguimento de Jesus, até a Cruz e a Ressurreição.  Evitemos criar uma caricatura de Jesus como Rei poderoso, conforme os padrões da nossa sociedade, e procuremos recuperar a finalidade da ação profética de Jesus – reacender a esperança dos excluídos, marginalizados, pobres e oprimidos, assumindo cada vez mais ações concretas na luta contra quaisquer formas de expoloração e tráfico humano, na busca da construção da sociedade que Deus sonha, vivendo os valores do Reino.
Tomaz Hughes SVD
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