Mt 16, 13-20
“E vocês, quem dizem que eu sou?”

Aqui temos a versão mateana da profissão de fé de Pedro, que Marcos (Mc 8, 27-35) coloca como pivô de todo o seu evangelho.  Este trecho levanta as duas perguntas fundamentais de todos os evangelhos: quem é Jesus? O que é ser discípulo dele?  São duas perguntas interligadas, pois a segunda resposta depende muito da primeira. A minha visão de Jesus determinará a maneira do meu seguimento dele.

Como refletimos domingo passado sobre a versão lucana desse texto (Lc 9, 18-24), remetemo-nos à aquela reflexão e aqui somente assinalaremos alguns poucos pontos a mais, já levando e conta o que foi escrito para dia 23 de junho.
Depois de Jesus interrogar duas vezes os discípulos, o texto de Mateus acrescenta vv. 17-19, pois quer destacar o papel de Pedro (e, por conseguinte, dos líderes da sua própria comunidade), na função de ligar e desligar da comunidade, que nos Evangelhos somente aqui e em Cap. 18 é chamada de “Igreja”.  “As chaves do Reino” não se refere aqui ao poder de perdoar pecados, mas de integrar e desligar pessoas da comunidade dos discípulos.
O fundamento, o alicerce, a pedra fundamental dessa comunidade é o conteúdo da profissão de Pedro “Tu és o Messsias, o Filho de Deus vivo”.  Mas continuam no ar as duas perguntas que são o cerne do Evangelho: “Quem é Jesus?”, e “o que significa segui-lo?“  Pois os termos que Pedro usa são ambíguos, porque cada um os interpreta conforme a sua cabeça.  Por isso, Jesus toma uma atitude, aparentemente estranha: “Ele ordenou os discípulos que não dissessem a ninguém que ele era o Messias!”
.  Que coisa esquisita!  Jesus proíbe que se fala a verdade sobre ele!  Como é que ele espera angariar discípulos deste jeito?  O assunto merece mais atenção.
Realmente, Pedro acertou em termos de teologia, de “ortodoxia”, conforme diríamos hoje.  Ele usou o termo certo para descrever Jesus.  Mas Jesus quer esclarecer o que significa ser “O Messias de Deus”.  Pois cada um pode entender este termo conforme os seus desejos.  Jesus quer deixar bem claro que ser “messias” para ele é ser o “Servo de Javé”. É vivenciar o projeto do Pai, que necessariamente vai levá-lo a um choque com as autoridades políticas, religiosas, e econômicas, enfim, com a classe dominante do seu tempo, e não o Messias nacionalista e triunfalista das expectativas de então.  Pedro teve que aprender essa exigência do discipulado, de uma maneira lenta e dolorosa, passando até pela negação de Jesus na noite da sua prisão.  Aprendeu tão bem que chegou a dar a sua vida como mártir, também morrendo, conforme a tradição, em uma cruz, no Circo de Nero em Roma, onde atualmente se localiza a Basílica que traz o seu nome. Aprendeu a duras penas ser discípulo de verdade e cumprir a missão que recebeu de Jesus na Última Ceia: “Eu rezei por você, para que a sua fé não desfaleça.  E você, quando tiver voltado para mim, fortaleça os seus irmãos”(Lc 22,32).  Aqui temos o essencial do ministério petrino, continuado no Papa – confirmar e fortalecer a fé dos irmãos e irmãs.  A Igreja sempre deve zelar que acréscimos históricos, mais adequados a monarcas do que a discípulos, não escondem essa missão essencial.
Paulo, que durante os seus primeiros anos da vida adulta, perseguia os discípulos, também teve a graça da conversão, chegando a afirmar que não queria saber nada a não ser Jesus Cristo e Jesus Cristo Crucificado!!! (I Cor 1,2).  Ele também pagou com a sua vida essa decisão pelo discipulado.
No nosso tempo, quando é moda apresentar um Jesus “light”, sem exigências, sem paixão, sem Cruz, sem compromisso com a transformação social, o texto nos desafia para que clarifiquemos em que Jesus acreditamos.  O Jesus quebra-galho, que existe para resolver os meus problemas pessoais, tão propagado por setores da mídia e por diversos movimentos e pregadores, ou o Jesus bíblico, o Servo de Javé, que veio para dar a vida em favor de todos?
Tomaz Hughes SVD
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